terça-feira, 27 de maio de 2014

Tributos sobre a Folha: Uma Proposta

Paulo Werneck

Tarsila do Amaral: Operários
Fonte: Governo do Estado de São Paulo

Há muito tempo que existem propostas no sentido de ser desonerada a folha de pagamento, propostas essas algumas vezes vinculadas a movimentos em prol da redução dos direitos trabalhistas.

Defendo a desoneração da folha sem prejuízo dos direitos trabalhistas, pelos motivos e da forma expostos a seguir.

Problemas da Tributação da Folha de Pagamento

Um tributo, como princípio geral, deve procurar ser neutro em relação aos agentes econômicos, sem privilegiar uns em detrimento de outros, sem incentivar certas decisões em detrimento de outras. É claro que existem muitas exceções, em que os tributos são criados justamente para intervir na economia, como no caso do aumento das alíquotas incidentes sobre o fumo, para desestimular seu consumo, ou na redução do IPTU incidente sobre imóveis antigos que apresentem boa manutenção, para estimular a preservação do patrimônio histórico.

No caso em tela, a existência de tributos sobre a folha de pagamento não é neutro, pois incentiva a substituição de mão de obra por equipamentos.

Digamos que um empresário resolva vender bebidas geladas e quentes. Poderá optar por contratar vendedores ou usar uma máquinas automáticas de vendas. O custo dos vendedores será onerado pela existência dos tributos sobre a folha, incentivando a opção pelas máquinas. Não apenas esses tributos não são neutros, como incentivam o desemprego, um objetivo indefensável por qualquer governo.

Os tributos sobre a folha de pagamentos também não é neutro em relação ao comércio exterior. Não há como desonerar as exportações e não há como onerar as importações. Assim os tributos incidentes sobre a folha de pagamentos incentiva as importações e encarece as exportações, prejudicando a indústria nacional, outro objetivo indefensável.

A proposta

A proposta é simples. A União deve avaliar o total arrecadado pelos diversos tributos desse tipo, ou seja, todos os que incidem sobre a folha, e criar um tributo sobre o faturamento de vendas no mercado interno com alíquota cuidadosamente definida de modo a arrecadar exatamente o mesmo que antes, eliminando todos os tributos incidentes sobre a folha e substituindo-os por esse único novo tributo, com alíquota única, independentemente de qualquer outra variável, especialmente sem considerar a quantidade de empregados de cada empresa.

Ademais, deverá destinar a arrecadação total desse tributos exclusivamente para as destinações anteriores dos diversos tributos sobre a folha de pagamento, nas mesmas proporções.

Além disso deverá ser criado um tributo sobre as importações, a ser aplicado sobre o total das despesas de importação, com a mesma alíquota, simulando assim o faturamento das empresas estrangeiras.

Conclusões

Tendo em vista que nem o montante arrecadado de acordo com o novo modelo, nem sua destinação não devem apresentar variações significativas em relação ao modelo anterior, essa proposta é superior à situação anterior por não apenas ser neutra em relação à opção empresarial de utlizar mão-de-obra ou automatizar, como pelo menor custo administrativo, simplificando sobremaneira a contabilidade.

Essa proposta também não contém em seu bojo qualquer modificação nos direitos trabalhistas.

Finalmente, apresenta maior neutralidade em relação ao mercado exterior. Não é totalmente neutra pois as exportações ainda serão oneradas pelos tributos embutidos nos insumos que vier a utilizar, e as importações continuarão a se beneficiar da não oneração pelos tributos equivalentes que incidiriam sobre os insumos, mas já seria uma situação bem mais próxima da neutralidade desejável.

terça-feira, 4 de março de 2014

Competitividade Brasileira

Paulo Werneck

Finalmente, a sexta e última aspiração dos contribuintes, segundo a avaliação de Antônio de Oliveira Santos, presidente da Confederação Nacional do Comércio, é:
"assegurar competitividade aos produtos nacionais"
Conquanto a princípio essa aspiração possa parecer legítima a princípio, pode ser interpretada de duas maneiras:
oferecer subsídios aos produtos nacionais, ou
não tributar mais os produtos nacionais que os estrangeiros
A primeira alternativa é desaconselhável, pois onera a sociedade como um todo em favor de alguns empresários que podem auferir confortavelmente seus lucros sem precisarem se preocupar com qualidade nem produtividade.

É verdade que pode garantir a manutenção de postos de trabalho, que desapareceriam junto com o fechamento da empresa não competitiva, mas a longo prazo incentiva a indústria a não se modernizar e prejudica a competitividade nacional no exterior.

Subsídios não são necessariamente ruins: há situações em que são benvindos, geralmente associados a início de empreendimentos e a prazo certo para serem retirados. Todavia devem ser usados topicamente e não como alternativa a um sistema tributário nefasto.

A segunda alternativa pode, à primeira vista, parecer ociosa: as mercadorias estrangeiras, ao serem importadas, não pagam os tributos internos e o Imposto de Importação, o que as torna necessariamente mais caras que as mercadorias nacionais?

Pode parecer ociosa, mas não o é. As mercadorias nacionais são oneradas mesmo quando isentas.

A primeira forma de oneração é pelo custo do cumprimento das obrigações acessórias e até mesmo do acompanhamento da evolução do sistema tributário.

Até mesmo a prosaica declaração anual de ajuste do Imposto de Renda pessoa física exige a instalação de um programa e a leitura das novidades, porque a cada ano o programa é diferente. Se multiplicarmos o tempo de instalação do programa pela quantidade de contribuintes, teremos um custo nada razoável de comunicação de dados, de estudo das novidades, sem contar com os treinamentos anuais que a Secretaria da Receita Federal do Brasil ministra aos seus servidores, o que implica em horas não trabalhadas na fiscalização, diárias e passagens.

A segunda forma de oneração é pelos tributos invisíveis, tais como os tributos sobre o trabalho e aqueles sobre a circulação das mercadorias que se perdem, quando uma empresa tributada pelo Simples se insere na cadeia produtiva, fazendo com que o ICMS e o IPI, que em princípio são não-cumulativos, se tornem cumulativos.

Uma forma extendida de tributação invisível se dá pelo IOF, a onerar o financiamento do capital de giro e de investimento. É o inverso da máxima de tributar aquele que pode pagar, que tem sinais exteriores de riqueza. No Brasil se tributa quem não tem e precisa tomar empréstimo...

O PIS-Importação e a Cofins-Importação são tentativas de diminuir a desvantagem das mercadorias nacionais frente às estrangeiras, aplicando-se a estas uma estimativa da carga que incidiria sobre as nacionais, apenas uma estimativa, pois nunca se poderá saber quanto efetivamente há de PIS ou de Cofins embutidos numa mercadoria nacional.

Por outro lado, nas exportações as mercadorias nacionais não são isentas nem do PIS, nem da Cofins, nem dos IPI e ICMS incorporados às mercadorias pela presença na cadeia produtiva de empresas tributadas pelo Simples.

Pode-se atender a essa última aspiração eliminando os tributos "invisíveis", qual seja extinguindo o PIS e a Cofins, eliminando o IOF que venha a incidir sobre a atividade produtiva e simplificando ao máximo o IPI e o ICMS de modo a que se possa acabar com o Simples e sua  desfuncionalidade em relação ao sistema.

O volume da arrecadação não precisa ser afetado, bastando para tal aumentar proporcionalmente as alíquotas dos tributos remanescentes. As destinações dessas contribuições também não precisam ser afetadas, bastando para tal incluir-se no orçamento da União verbas equivalentes a terem as referidas destinações.

Para que as mercadorias nacionais não sejam oneradas por tributos internos ao serem exportadas, como não o são as mercadorias dos demais países, é um caminho possível e necessário.


Veja também:
Pressupostos de uma Reforma Tributária.

Fontes:

SANTOS, Antônio de Oliveira. Aspirações dos Contribuintes Brasileiros. O Globo, de 19 de junho de 2011. In QUEIROZ, Cid Heráclito de. A Reforma Tributária Possível. Carta Mensal, setembro de 2012, nº 690. Rio de Janeiro: CNC, 2012.

domingo, 9 de junho de 2013

Tributos e Investimentos

Paulo Werneck

A quinta aspiração dos contribuintes, segundo a avaliação de Antônio de Oliveira Santos, presidente da Confederação Nacional do Comércio, é:
"desonerar os investimentos"
Esta aspiração não deixa de ter seu atendimento buscado pelos sucessivos governos. Pululam nas páginas dos diários oficiais normas instituindo inúmeros regimes especiais, Reporto, Repetro, Reisso, Reaquilo, sempre oferecendo isenções ou suspensões tributárias.

Essa prática nem se pode considerar nova. Nos primeiros anos após o achamento do Brasil, o rei português fez contratos de exploração das novas terras em que a tributação sobre os bens levados a Portugal variava ao longo do tempo, podendo até começar com isenção total.

Em tudo similar às isenções tributárias concedidas a certos investimentos, notadamente instalação de indústrias, durante os primeiros anos de funcionamento das mesmas.

Entretanto a política atual não deixa de ser um pouco esquizofrênica: por um lado complica ao máximo a vida dos novos empreendimentos, para isentar alguns, principalmente aqueles com enorme poder de pressão.

Porque tanta complicação para a concessão de um alvará? Porque a necessidade de inscrições nos três níveis de governo? Porque até uma simples placa na frente de uma loja exige tanta burocracia?

Além disso, mesmo quando o empreendimento incentivado pretende usar os benefícios tributários a que tiver direito, se vê às voltas com um sem número de obrigações acessórias, que podem até mesmo tornar inúteis as vantagens pretensamente obtidas.

Um exemplo claro: a burocracia associada ao papel imune destinado à impressão de livros, jornais e periódicos. São tão detalhados os relatórios, que pode ser mais vantagem não utilizar a imunidade.

A solução, todavia, seria muito simples: a imunidade geral ao papel, o que praticamente em nada mudaria a arrecadação estatal, tendo em vista a não cumulatividade do IPI e do ICMS: esses tributos não recolhidos no papel não seriam creditados nos cadernos, nos blocos de notas, nas agendas. A perda ficaria restrita ao papel vendido em resmas para as empresas, logo consumidos na burocracia das mesmas, acabando por gerar tributação nos produtos ou serviços delas...


Veja também:
Pressupostos de uma Reforma Tributária.

Fontes:

SANTOS, Antônio de Oliveira. Aspirações dos Contribuintes Brasileiros. O Globo, de 19 de junho de 2011. In QUEIROZ, Cid Heráclito de. A Reforma Tributária Possível. Carta Mensal, setembro de 2012, nº 690. Rio de Janeiro: CNC, 2012.

WERNECK, Paulo. Contratos do Pau Brasil, disponível em http://guardamoria.blogspot.com.br/2011/05/contratos-do-pau-brasil.html.

sábado, 18 de maio de 2013

Carta Capital: A Máquina Intacta da Desigualdade

Paulo Werneck

Carta Capital (nº 747, de 8 de maio de 2013) publicou a matéria "A Máquina Intacta da Desigualdade", escrita por André Barrocal, em que afirma que nada é tão difícil quanto mudar o sistema tributário nacional. Essa frase é e não é verdadeira.

Nada muda tanto quanto o referido sistema, bombardeado por miríades de normas, vindas da União e de cada um dos entes federados, as dezenas de estados e os milhares de municípios, todos com competência legislativa tributária acrescida da regulação acessória pelos executivos, com seus decretos, portarias, atos declaratórios, instruções normativas, normas de execução, etc.

Eu diria que nada muda tanto quanto o sistema tributário nacional, para desespero dos contribuintes e mesmo dos servidores das administrações tributárias.

Mas a matéria se referia a mudanças para o bem, mudanças que viessem a reduzir a injustiça social de um sistema tributário altamente regressivo. E nisso, certamente, as alterações são quase impossíveis...

Barrocal registra alguns avanços: processo no Senado para unificar a legislação do ICMS, com a promessa de posterior simplificação da legislação do PIS e da Cofins. Serão medidas boas, se chegarem a bom termo, no sentido de reduzir um pouco a selva normativa tributária.

Registra também, com base em declarações do presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco), que o governo Fernando Henrique Cardoso operou na direção do aumento da regressividade tributária ao patrocinar duas leis que baixaram o IR das empresas, isentaram a remessa de lucros, criaram a figura do juro sobre capital próprio, eliminaram a alíquota de 35% e congelaram a tabela do IR das pessoas físicas. Foi esquecida a lei que permitiu ao sonegador escapar da prisão se na undécima hora viesse a pagar o que sonegara.

Nessa direção, Barrocal noticia que o Sindifisco e outras entidades iniciarão campanha para renovar a tabela do IR e para cobrar IPVA de jatinhos e iates.

Enfim, uma excelente matéria, mas que só abordou um aspecto do problema, a regressivida explícita, escancarada, do nosso sistema tributário.

A regressividade implícita, pelo custo da própria administração do sistema, que dificulta a criação e a operação das empresas, encarecendo as mercadorias e diminuindo a competitividade internacional do país, logo eliminando postos de trabalho, não foi abordada.

Mesmo assim, ótima matéria, clara, veraz e objetiva. Nossos parabéns à revista e ao autor.

domingo, 5 de maio de 2013

Consolidação da Legislação Tributária

Paulo Werneck

A quarta aspiração dos contribuintes, segundo a avaliação de Antônio de Oliveira Santos, presidente da Confederação Nacional do Comércio, é:
"consolidar a legislação fiscal, pois a sociedade não suporta mais as 240.210 normas em vigor, segundo o IBPT"
Essa aspiração, como a anterior, também em nada modifica a carga tributária, nem reduz o quantum a ser arrecadado, mas diminui o esforço da Administração, dos contribuintes e do Judiciário em acompanhar e compreender a legislação.

Não sei se existem as tais 240.210 normas em vigor, conforme a contagem do IBPT, aliás um número que, se verdadeiro, já estaria amplamente superado, pelo tempo decorrido e a sanha regulatória do Estado. Posso dizer que só instruções normativas são mais de mil em vigor. Às vezes algumas são consolidadas, então a quantidade reduz um nada, mas logo a norma consolidadora passa a ser emendada, e o contador volta a crescer. Tudo isso, todavia, é feito ao arrepio da lei, pois o Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966), no artigo 212, determina que:
Os Poderes Executivos federal, estaduais e municipais expedirão, por decreto, dentro de 90 (noventa) dias da entrada em vigor desta Lei, a consolidação, em texto único, da legislação vigente, relativa a cada um dos tributos, repetindo-se esta providência até o dia 31 de janeiro de cada ano. Quem multará o governo federal, todos os estaduais e todos os municipais por esse desrespeito sistemático à lei? Quando um juiz desconsiderará uma norma publicada em ano anterior, por ter perdido a vigência por não ter sido recepcionada na consolidação do ano subsequente (que não foi feita)?
No entanto, a obediência a tão razoável artigo é mais que simples, e pode ser feita a curto prazo, com algum risco e muito esforço, ou a médio prazo, sem risco e quase sem custo adicional.

Na primeira hipótese, há que ser formados grupos de fiscais especializados, para, sem aflição e com determinação, sistematizar toda a legislação da sua área, baseando-se nos trabalhos e livros já existentes.

Na segunda alternativa, basta que, a cada nova publicação de alguma alteração, aproveite-se para consolidar as normas que tratem do mesmo assunto, o que irá, ao longo do tempo, reduzindo a quantidade absurda de normas em vigor. Por exemplo, ao publicar-se uma nova instrução normativa referente a admissão temporária, aproveita-se e consolida-se todas as normas referentes à esse regime aduaneiro, revogando-as na nova norma.

Veja também:
Pressupostos de uma Reforma Tributária.

Fontes:
BRASIL. Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966). Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.
SANTOS, Antônio de Oliveira. Aspirações dos Contribuintes Brasileiros. O Globo, de 19 de junho de 2011. In QUEIROZ, Cid Heráclito de. A Reforma Tributária Possível. Carta Mensal, setembro de 2012, nº 690. Rio de Janeiro: CNC, 2012.